Técnica de transplante de medula pode diminuir fila por doadores, mas divide especialistas...


Uma técnica relativamente nova pode ajudar a diminuir a fila de pessoas que necessitam de transplante de medula óssea¹. Chamado de transplante haploidêntico, o método utiliza células de pessoas que não são 100% compatíveis com o receptor (ao contrário das outras duas técnicas que necessitam de 100% de compatibilidade) para que ele tenha a medula substituída. Especialistas se dividem entre defender o método e sobre os riscos de infecções.

O procedimento existe há cerca de 15 anos, mas nos últimos anos ganhou novas estratégias de aplicação e vem ganhando espaço como tratamento, de acordo com a hematologista Aline Miranda, do Centro de Transplante de Medula Óssea da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo.

“Na medicina, além do transplante haploidêntico, temos os transplantes autólogo, quando as células utilizadas no transplante são do próprio paciente; o alogênico, quando as células são provenientes de um doador da família (irmão); e o alogênico não-aparentado, quando o receptor recebe células de um doador que não é da família e pertence ao banco de doadores de medula óssea. Essas técnicas exigem compatibilidade de células em 100% e caso o paciente não tenha familiar compatível e não encontre doador compatível no banco de medula, ele pode ter que esperar muito tempo para encontrar esse doador e isso pode ser fatal. Com o transplante haploidêntico, conseguimos transplantar a medula de doadores de compatibilidade menor que 100% e dar esperança a quem precisa receber uma nova medula”, afirmou a médica.

No transplante haploidêntico, a incompatibilidade entre doador e receptor é barrada com a utilização de medicamentos e a realização de quimioterapia e radioterapia específicas que diminuem as chances de rejeição da nova medula.

Com esse método, o futuro transplantado pode receber células 50% compatíveis vindos do pai, da mãe e dos seus filhos, além de células com compatibilidade menor que 100% vindas do banco de medula.

“A gente tem uma grande miscigenação no Brasil, resultando em uma grande mistura genética e isso dificulta o encontro de um doador 100% compatível com o receptor. Nem sempre o receptor tem irmãos e isso também é um entrave. Então com o método haploidêntico temos chance de poder realizar o transplante em mais pessoas e conseguir diminuir a fila de espera. Geralmente temos bastante êxito com o haploidêntico, já que a taxa de rejeição nesse tipo de transplante fica entre 5% e 10%”, contou a médica Aline Miranda.

Paraibano defende método, mas fala sobre infecções

De acordo com o médico hematologista André Cunha de Oliveira, as técnicas de transplante de medula óssea têm características semelhantes, mas o tratamento e os possíveis efeitos pós-transplante são diferentes.

“No transplante autólogo, o paciente tem um linfoma, por exemplo. Se a doença desaparecer ou diminuir, nós colhemos células-tronco do paciente e ele passa por quimioterapia e outros procedimentos para destruir a medula. Após isso, ele vai receber as células-tronco que haviam sido colhidas para que essas células regenerem a medula óssea. Por isso é um tratamento em que ele recebe células dele mesmo, facilitando o processo já que são células que o organismo do paciente está adaptado”, contou André.

Nos transplantes alogênico e alogênico não-aparentado, que necessitam de 100% de compatibilidade, o paciente recebe células de outras pessoas. Por conta disso, segundo André Cunha, existe um maior risco de rejeição ou de complicações pós-transplante.

“No transplante alogênico, o paciente recebe a medula de um irmão ou de uma pessoa do banco de dados, onde é feito um procedimento alogênico não-aparentado. É uma medula diferente da qual o organismo do paciente é adaptado, então a quimioterapia é diferente e a imunossupressão (que reduz a atividade ou eficiência do sistema imunológico através de medicamentos) também. O período de internação é semelhante a do transplantado autólogo, mas o paciente é mais suscetível a infecções”, disse o hematologista.

Ainda segundo André, o transplante haploidêntico, mesmo sendo o que pode mudar a realidade da fila de espera por uma medula, é o que mais tem possibilidade de infecção e de demora na recuperação pós-transplante.

“No haploidêntico o grau de estranheza do organismo para com as novas células é maior, pois a compatibilidade não é 100%. Com isso é necessário mais medicamentos e imunossupressão do que nos outros transplantes. Além disso, o risco de infecção também é maior. Porém, a grande importância do transplante de medula óssea haploidentico é que, teoricamente, todo paciente com pai ou mãe vivo teria um doador potencial. Isso é fundamental e importante para diminuição da fila de espera por uma nova medula”, frisou André Cunha.

Paraíba segue sem realizar transplantes

Mesmo com o Hospital Napoleão Laureano atendendo a pacientes de câncer e com doenças do sangue, a Paraíba continua sem condições de realizar o transplante de medula óssea. Segundo o diretor-geral do Laureano, o Ivo Sérgio, o hospital não tem condições de oferecer o serviço de transplante ainda porque o procedimento é caro e necessita de um laboratório dedicado ao procedimento.

“O Laureano não consegue oferecer o transplante ainda porque o serviço é extremamente caro. Exige um laboratório para verificar as possibilidades de compatibilidade, equipes dedicadas e uma quantidade mínima de transplantes por mês. Aqui nós tratamos pela quimioterapia, mas os pacientes paraibanos que precisam receber novas medulas são enviados para fazer o transplante em Recife (PE) ou São Paulo (SP)”, disse o diretor-geral. 

A necessidade do Estado ter um hospital que realize o transplante de medula óssea também é levantada pelo hematologista André Cunha. Para ele, mesmo com a necessidade, a previsão é de que os transplantes não vão ser realizados tão brevemente na Paraíba.

“Não vejo uma previsão do transplante ser realizado aqui. O que se pode implantar mais brevemente é o autólogo, que tem um grau de complexidade bem menor do que o haploidêntico. Na Paraíba não dispomos de nenhum serviço de transplante, apesar da extrema necessidade de implantação. Porém, o hospital que oferecer o serviço tem que ter todo apoio de infraestrutura e investimentos já que a complexidade do procedimento é relativamente alta. Com tudo isso, é necessário implantar o serviço porque a quantidade de pessoas que esperam por esse transplante é grande e muita gente morre na fila”, concluiu André.

Ao Portal Correio, a assessoria de comunicação da Secretaria de Saúde do Estado informou que as pessoas que necessitam de transplante na Paraíba recebem acompanhamento médico, passam por exames e realizam o transplante através do programa Tratamento Fora do Domicílio (TFD)

Segundo a SES, o serviço fornece passagens para atendimento médico especializado de diagnose, terapia ou cirúrgico em alta complexidade, a ser prestado a pacientes atendidos exclusivamente pelo SUS, em outros estados, além de ajuda de custo para alimentação e pernoite de paciente e acompanhante, se necessário. 

Seja um doador

Os interessados em doar medula óssea na Paraíba devem se cadastrar no Hemocentro de João Pessoa e Campina Grande e nos Hemonúcleos espalhados pelos municípios de Piancó, Picuí, Monteiro, Patos, Itaporanga, Cajazeiras, Guarabira, Catolé do Rocha, Princesa Isabel e Sousa.

“O pessoal tem muito medo de que a doação seja feita com uma furada de agulha. Atualmente, a doação da medula óssea acontece com a tomada de medicamentos pelo doador. Esse medicamentos fazem com que a medula circule pelo sangue, possibilitando que a gente colha o sangue e possa fazer o transplante. Não existe desconforto para o doador”, afirmou a médica Aline Miranda.

¹Medula óssea - A medula óssea é um tecido líquido-gelatinoso que ocupa o interior dos ossos. Ela é responsável pela produção de hemácias, leucócitos e plaquetas que circulam no sangue.

Fonte:Halan Azevedo

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